Agronegócios
A extinção de insetos que já afeta a produção global de alimentos
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Nossos amigos insetos estão sendo extintos. Precisamos encontrar alguma forma de abrir mais espaço para eles.
Nos últimos 20 anos, um fluxo constante de estudos científicos concluiu que hoje existem menos insetos do que antes. Tanto o peso combinado (chamado pelos cientistas de biomassa) quanto a diversidade das espécies de insetos diminuíram.
Alguns estudos foram baseados em observações de entomólogos amadores, enquanto outros envolveram cientistas que contaram o número de insetos atingidos pelos para-brisas dos carros. Outros passaram anos coletando insetos voadores em armadilhas e os pesaram.
Nos últimos seis anos, a quantidade de estudos aumentou muito. Pesquisas cada vez mais sofisticadas confirmam que, embora nem todas as espécies de insetos estejam diminuindo, muitas delas enfrentam sérios problemas.
Até pouco tempo atrás, muitas evidências vinham de áreas protegidas na Europa e, em menor escala, da América do Norte. Qual será então a situação em outras partes do mundo?
Um novo estudo oferece dados novos sobre as migrações sazonais de insetos no leste asiático. Muitos desses insetos são considerados pragas. Todos os anos, eles voam para o norte na primavera para aproveitar a nova estação de cultivo e voltam para o sul no outono, para escapar do frio.
A queda progressiva dessa imensa quantidade de migrantes indica que, de fato, trata-se de um problema global.
Milhões de insetos migratórios
Entre 2003 e 2020, cientistas da Academia Chinesa de Ciências Agrícolas na capital da China, Pequim, capturaram quase três milhões de insetos migratórios em armadilhas luminosas na ilha de Beihuang, no litoral nordeste da China. E outros nove milhões de insetos foram detectados nos registros de radares.
Ao todo, foram identificadas e contadas 98 espécies. A maioria delas era de pragas que se alimentam da produção agrícola ou insetos que são seus inimigos naturais — predadores e parasitas.
Ao longo do período de 18 anos, a contagem anual de todos os insetos identificados caiu em 7,6% — uma tendência de redução estável de 0,4% ao ano.
Claramente, o número de insetos vem diminuindo em grande escala na Ásia, da mesma forma que na Europa e na América do Norte. Parece razoável considerar que os motivos sejam os mesmos. Não sabemos ao certo quais são essas causas, mas parece provável que elas estão presentes em todo o mundo.
O estudo também demonstrou que insetos pragas como a lagarta-rosca, que ataca muitas espécies de vegetais alimentícios, sofrem forte impacto com a redução mundial dos insetos, da mesma forma que espécies que não são pragas, como as abelhas e borboletas, que foram objeto da maior parte dos estudos europeus e americanos anteriores.
Estamos tão acostumados a considerar os insetos como pragas que é tentador pensar que, em um mundo com menos insetos, a agricultura poderia prosperar como nunca antes conseguiu. Mas este novo estudo revela por que isso não é verdade.
Os pesquisadores usaram registros entomológicos detalhados do passado para construir uma complexa rede alimentar, demonstrando como cada uma das espécies de insetos pragas capturadas nas armadilhas luminosas pode ser alimento de diversos tipos de insetos predadores e parasitas, frequentemente chamados de “inimigos naturais”.
As lagartas-roscas, por exemplo, são comidas pelo bicho-lixeiro, entre outros.
Os pesquisadores compararam a velocidade de declínio de 124 pragas e de cada um dos seus inimigos naturais.
Ao longo dos 18 anos de estudo, a incidência das espécies inimigas naturais diminuiu em 0,65% ao ano, enquanto a quantidade das pragas que se alimentam de plantas, em média, não se reduziu. Isso indica que as espécies benéficas, inimigas naturais das pragas, têm maior propensão ao declínio do que aquelas que servem de alimento.
Por isso, os agricultores precisam decidir se irão tolerar produções menores ou usar ainda mais inseticidas químicos para controlar as pragas, gerando reduções ainda maiores.
É muito fácil apontar os pesticidas, a iluminação pública brilhante e as mudanças climáticas como as causas, mas o declínio dos insetos, quase certamente, tem diversas causas simultâneas. O suspeito indicado com mais frequência é a intensificação da agricultura.
Esta expressão engloba diversas ações errôneas. A mecanização da agricultura, a erradicação das sebes, a monocultura, o aumento do uso de fertilizantes químicos e a aplicação regular de pesticidas têm como objetivo produzir campos sem ervas daninhas, pragas ou doenças. Apenas uma variedade reduzida de animais e plantas silvestres consegue sobreviver nas margens estreitas dos campos e à beira das estradas próximas.
Em outras palavras, os agricultores tornaram os campos inóspitos para a maioria dos insetos.
A intensificação pretende garantir que o máximo fluxo de energia possível do ecossistema das fazendas seja utilizado para a produção agropecuária para consumo humano. Estima-se que 24% de todo o crescimento vegetal anual do planeta sejam atualmente apropriados pelos seres humanos. E este percentual atinge o espantoso nível de 69% nas áreas de cultivo.
Estes números praticamente dobraram ao longo do século 20. Não surpreende que os insetos não se deem bem nesses cenários – e as áreas produtivas ocupam quase 40% das terras disponíveis.
A perda de espécies
Os insetos são, de longe, os animais mais numerosos da Terra. Estima-se que a massa total de novos insetos que crescem anualmente em todo o mundo atinja a surpreendente marca de 1,5 bilhão de toneladas.
A maior parte desse material é imediatamente consumida na cadeia alimentar por predadores e parasitas, de forma que a imensa superestrutura de toda a diversidade animal da Terra é estabelecida sobre uma base de insetos e seus parentes artrópodes.
Se houver menos insetos, o número de outros animais silvestres inevitavelmente também irá diminuir. Já existem evidências de que isso esteja acontecendo.
Na América do Norte, a população de espécies de aves que se alimentam de insetos sofreu redução média de quase 10 milhões de indivíduos nos últimos 50 anos, enquanto as espécies que não têm os insetos como presas essenciais não sofreram redução.
Na Europa, a redução paralela das populações de andorinhas insetívoras, andorinhas-dos-beirais e andorinhões foi relacionada ao declínio dos insetos.
É verdade que alguns insetos são uma ameaça aos seres humanos, como os mosquitos transmissores de doenças. Mas a ampla maioria dos insetos é benéfica: eles polinizam a produção agrícola, fornecem controle natural de pragas, reciclam nutrientes e ajudam na formação do solo, participando da decomposição de plantas e animais mortos.
Todos esses processos serão prejudicados com a eventual escassez dos insetos. O valor econômico desses serviços é incalculável — a agricultura não conseguiria se manter por muito tempo sem eles.
BBC Brasil